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, 20 maio 2024
 
 

Romper barreiras

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(*) Dom Walmor

O sertanejo usa, sabiamente, o verbo romper com uma semântica própria que se refere à imperiosa e indeclinável necessidade de se ir adiante. Não existe a hipótese de se pensar em parar ou, menos ainda, de retroceder. A alma sertaneja é, por isso mesmo, um poço de lições que alavancam a luta e apontam rumos para se vencer barreiras, que não são poucas. Enfrentá-las é tarefa desafiadora para quem tem uma vida difícil. Exige-se um “passo a passo” ritmado para configurar um percurso em que não se pode parar. É preciso avançar sempre. Assim como essa referência sertaneja, “alma mater” na vida do povo brasileiro, outras culturas com suas dinâmicas e tradições constituem heranças relevantes para superar as crises contemporâneas. A sociedade deve, nesse sentido, revisitar suas tradições e dinâmicas culturais, para conquistar entendimentos novos à luz dessas heranças.

As tradições podem ser ferramentas para se recuperar a força perdida, os sonhos desfeitos e consertar depredações que vão desfigurando a vida, a história, com a negociação insensata de valores, cada vez mais relativizados. O resultado desolador disso tudo está na desarrumação da Casa Comum, isto é, da comunhão. O planeta torna-se um “caldeirão efervescente”. Os avanços de inteligentes conquistas tecnológicas contracenam com irracionalidades que matam, interrompem projetos e sonhos. Diante dessa contradição, é preciso trabalhar para romper barreiras. Entre os obstáculos, está a urgência de se mudar mentalidades e ajustar compreensões com lâmpada luzente, indicando novos caminhos que permitam o encontro de respostas necessárias.

Em pauta, de modo tenso e preocupante, está a realidade da Amazônia. Trata-se de temática delicada, por situar-se essa realidade no coração da nação brasileira, intocável em sua soberania, mas no contexto ampliado de mundo em se considerando sua enorme importância para o equilíbrio do planeta, com riquezas relevantes e de grande abrangência. Essa é uma pauta com força educativa para o conjunto da sociedade brasileira com desdobramentos de incidências planetárias. Oportunidade para um percurso educativo indispensável ao se considerar que a Amazônia, por suas riquezas multiétnicas, multiculturais e religiosas, por seu tesouro mineral, de fauna e de flora, pode garantir uma importante virada civilizatória.

O povo brasileiro enriquecido com o patrimônio de tantos biomas, desafiado a um processo educativo transformador no horizonte da ecologia integral, tem na configuração gigantesca da Amazônia, na relevância dos biomas e dos povos tradicionais, oportunidade única para aprender a dar novo passo, rompendo barreiras de entendimentos e práticas comprometedoras do meio ambiente. Há, pois, em curso, uma grande movimentação a partir da Amazônia. Uma movimentação para romper barreiras, que não são poucas – muitas delas relacionadas à idolatria do dinheiro e ao equivocado uso dos bens da Criação. Por isso mesmo, dedicar-se à região amazônica não se trata de uma temática ambientalista, política ou econômica simplesmente. A Amazônia é uma importante pauta cidadã exigindo que todos os segmentos da sociedade se abram aos impactos, de variados tipos, dali advindos com sua força transformadora e balizadora de possíveis novos marcos civilizatórios.

No horizonte da ecologia integral, como aponta, humildemente, o Papa Francisco, na sua Carta Encíclica sobre a Casa Comum, a sociedade brasileira é chamada a matricular-se nessa escola de aprendizagem nova que, para além de disputas e de tratamentos viciados, entendimentos pouco lúcidos, a exemplo da busca pelo lucro a todo custo, pode impulsionar alvissareiros e admiráveis patamares de desenvolvimento integral.

A Amazônia não é uma pauta exclusiva de alguns segmentos. As responsabilidades e compromissos são diferentes, mas o interesse deve ser de toda a sociedade brasileira, em vista do bem comum, da configuração de um novo “ethos” balizador das esperadas grandes mudanças civilizatórias. Compreende-se, pois, nesse horizonte, para além dos graves problemas específicos, como as queimadas a serem contidas com urgências e qualificação, a brasilidade está convocada a uma nova aprendizagem por um modo novo de conhecer, respeitar e promover o que significa o conjunto da Amazônia. Desafio amazônico que a Igreja Católica acolhe a partir da convocação do Papa Francisco: a realização do Sínodo dos Bispos para a Amazônia.

A Igreja Católica, com a clarividência a respeito dos papéis e das tarefas de muitos outros atores, está empenhada e investe na superação dos desafios da Amazônia, consciente que há uma nova estrada a percorrer, lições a aprender e a missão de iluminar esse caminho com a força da Palavra de Deus, lâmpada luzente. A Igreja oferece o melhor de si, a pessoa de Jesus Cristo, com os desdobramentos das urgências de se aprender o que é e como se vive uma ecologia integral. Enquanto aceita a tarefa de envidar esforços para novas respostas, reassume a responsabilidade de ser instrumento para construir um novo tempo, pelos valores do Evangelho, no respeito e diálogo, comprometida com a edificação de uma sociedade justa e solidária a caminho do Reino. É hora de romper barreiras.

(*) Dom Walmor Oliveira de Azevedo, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)

 

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