As recentes manifestações que se espalharam pelo Brasil vão entrar para a história política do país. Foram construídas, sobretudo, por uma gente nova, que ainda não havia mostrado seu rosto tão visivelmente e com tanto vigor. O número de manifestantes superou a marca de 1,5 milhão. O Brasil não via isso desde os comícios das “Diretas Já!”, em 1984, quando se lutava pelo retorno do voto universal e pelo fim da ditadura.
As movimentações conseguiram reduções nas tarifas de transporte coletivo em várias cidades, além do arquivamento da PEC 37 e da aprovação de 75% dos royalties do petróleo para a educação e 25% para a saúde pela Câmara dos Deputados Federais.
Essas imediatas conquistas devem ser comemoradas. E representam um sinal evidente de que formas tradicionais de se fazer política são, no mínimo, questionáveis. Isso serve aos partidos e às organizações de direita, patronais, de industriários, comerciários, agropecuaristas, banqueiros. Trata-se de uma ala da sociedade que imagina e luta por um Brasil cada vez mais dela, com menos impostos (para ela), mídias livres (para ela), educação cada vez mais adaptada ao mercado e pouco questionadora quanto ao status quo.
Essas movimentações novas também servem de análise aos partidos e às organizações de esquerda e centro-esquerda. Afinal, é inegável que os avanços conquistados, sobretudo desde 2003 em nível federal, se deram, também, à custa de uma diminuição de pressões nas ruas. Isso não é bom para a construção de uma democracia participativa, que precisa ter independência por parte das organizações quanto ao governo eleito.
É hora de enxergar a população nas ruas como principal protagonista social e político de um país, seja ela mais ou menos organizada, com lideranças explícitas ou diluídas, pautas definidas ou difusas. Se ela não for vista assim, imporá vigorosamente esta concepção.
Vias abertas – Agora, é bom lembrar que a rua é pública! E que, apesar da imensa contribuição para a democracia participativa, as atuais manifestações não podem, jamais, ter um caráter seletivo, excludente. Porque assim se passa facilmente ao autoritarismo, à postura ditatorial, fascista.
Por isso é bom olhar para trás. Ainda que não se veja no Brasil há décadas tantos protestos e com tanta gente, isto não significa que as mobilizações sociais tenham começado dias atrás. Milhares de dirigentes e membros das bases de sindicatos, partidos, ongs, associações e movimentos sociais estão há muito tempo na luta. E, de certo modo, mostraram aos mais jovens a importância de se batalhar para ter um país melhor e mais justo.
Salário mínimo, 13º salário, jornada de 8 horas diárias de trabalho, férias e o direito universal ao voto não caíram do céu. A conquista de espaço e a importância da mulher na sociedade, assim como a política de cotas para negros e indígenas, também não. Da mesma forma, o maior acesso ao ensino superior, a diminuição da pobreza e da miséria, a redução do desemprego ao nível de pleno emprego no Brasil, o aumento do poder de compra da população…
Tudo isso foi resultado da caminhada diária de homens e mulheres que ousaram erguer suas bandeiras contra governos e empresários hostis à democracia. Que tiveram a humildade e a inteligência de dialogar com pessoas que também sofriam muito, mas não percebiam quem eram seus algozes e nem acreditavam ser capazes de transformar a situação.
Portanto, sigamos na luta, sempre!
(*) Gibran Luis Lachowski, jornalista e professor do curso de Comunicação Social da Unemat\campus de Alto Araguaia