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Ao entrar na Universidade Federal de Mato Grosso, participei ativamente do movimento estudantil. Eram os anos finais do governo militar, tendo ainda no poder o General de Cavalaria João Baptista Figueiredo (1980/1985).
A participação das universidades brasileiras nos movimentos de redemocratização do país era grande e juntamente com o movimento sindical, e parte do antigo partido Movimento Democrático Brasileiro, hoje PMDB, reivindicavam a volta de eleições diretas para todos os cargos, anistia aos os presos políticos e a volta dos exilados.
O movimento estudantil da época tinha um engajamento político, atrelado a diversas correntes de esquerda. Uns ligados ao Partido Comunista Brasileiro, afinados com a URSS; ou ao Partido Comunista do Brasil, afinados com a Albânia (Um pobre países comunista do leste europeu). Um grupo minúsculo fazia parte do MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de outubro- morte de Che Guevara), protegidos do MDB. E por fim um grupo não alinhado a nenhuma dessas tendências que depois formarão o Partido dos Trabalhadores. O Bicho pegava naquela época.
As brigas pelo controle do Diretório dos Estudantes eram ferrenhas e até megafone era usado como arma na cabeça do adversário. Havia concordâncias e divergências. Todos concordavam que era urgente fazer a mudança, e ela deveria ser socialista, com o fim do regime militar no Brasil. O problema era a forma, a condução, o caminho a ser trilhado.
Como jovem de vinte e poucos anos, me empolguei com o movimento e lutei bravamente pelo fim do que chamávamos Ditadura Militar de 64. Cabelos encaracolados, calça jeans, chinelo de dedo e uma bolsa a tiracolo cheia de panfletos revolucionários. Eis as armas que usava contra os fuzis.
Nas assembleias estudantis, seja as do parque aquático da UFMT, ou no Restaurante Universitário (RU), o clima era de grande euforia e esperança que a revolução chegasse e acabasse com o medo, a insegurança, a pobreza e a desigualdade de modo geral.
Hoje refletindo sobre os acontecimentos e com a devida abstração sobre os atos vividos, tenho algumas dúvidas e opinião mais calejada sobre a tal ditadura do passado.
Em primeiro lugar é bom lembrar que o ato de 1964 aconteceu na madrugada de primeiro de abril, e os militares ao perceberem que a data seria vista como chacota e brincadeira, insistiram com a data anterior que é 31 de março de 1964. Falavam de revolução, mas o que prevaleceu nas escolas, na mente da maioria dos brasileiros foi à ideia de golpe.
A política de esquerda e seus lideres pregavam uma mudança política no país retirando os militares ditadores, mas tinham como referência de substituição política para o Brasil, de regimes também ditatoriais, como o da antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, China, Albânia e outras formas socialistas, ou comunistas como queiram. Portanto pregavam o fim da ditadura no Brasil, e queriam a implantação de outra.
A esquerda que tomou o poder com Lula e está ainda ai com a Dilma, percebeu que somente quando mudou de discurso conseguiu tomar o poder. Criticaram tanto o capitalismo, e hoje, Lula passeia com o antigo rei da soja para Cuba e chama Paulo Salim Maluf de amigo. Como dizem os jovens hoje, “ai que nojo”. Mudança de curso ou traição?
Os tempos na época eram, ou usar a força para continuar com o capitalismo, ou usar a força para implantar o socialismo. A violência era algo comum dos dois lados.
Excessos aconteceram, as torturas que já se praticavam contra presos comuns, foram usadas contra presos políticos, hoje a polícia faz uso cotidiano contra todos que caem em suas garras. Isso não mudou.
Cinquenta anos se passaram, mas parece que foi ontem, pois o ontem é ainda meu dia a dia, pois continuo vivo e ainda vivendo outra ditadura. Agora a de mercado, que divide o mundo entre os que têm muito dinheiro, e os que lutam pela sobrevivência. O que me faz lembrar alguém que me disse certa vez: Ditadura é quando você manda em mim, e democracia é quando eu mando em você.
Acredita?
(*) PEDRO FELIX é escritor em Cuiabá.