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“Ela é assim…”

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Sueli ignoti - 29-11-11

Pensando nas diferentes formas de arte, expressão do humano desde os primórdios da humanidade, podemos considerar que ninguém muda o mundo pela via da arte, mas não podemos negar que mudanças ocorrem no artista. Alguém pode ser o mesmo depois de jogar em sua criação o que sabe e principalmente o que não sabe de si mesmo? E o que dizer das pessoas privilegiadas pela oportunidade de usufruir da obra?  Conseguiriam ser as mesmas depois de discutir um livro, um filme ou visitar uma exposição experienciando com sua singularidade o que cada obra pode suscitar? Logo, parece que a dimensão de seu efeito não faz parte do mensurável…
Quando lidamos com aquilo que vai no interior de cada um as coisas podem ter uma mobilidade muito maior que as peças de um sofisticado quebra cabeças.  A figura a ser formada pertence ao universo da surpresa com possibilidades infinitas. As peças podem encontrar sempre novos encaixes quando passam a ser nomeadas ou renomeadas…
Assim, impossível não considerar aqui também as mudanças operadas pela arte de ouvir.  O que pode uma escuta diferenciada contribuir para a mudança daquele que fala? Sabemos que o sujeito da palavra é o único que detém a autoridade para falar de si. Mas quando isso não é possível ele pode ser falado? Considerando que a história de um ser humano começa antes de seu nascimento, quando é falado por aqueles que o desejam, pode essa história continuar depois de sua morte quando continua sendo falado por aqueles que o amam?
Temos no filme Elena um bom exemplo do que pode ser feito inclusive com a morte pela via da palavra, da arte. Petra Costa, jovem cineasta brasileira, nos mostra o que consegue pinçar e transformar quando resolve documentar a história da irmã a partir do que ficou após a perda. Ao perceber, através de todo o material que Elena deixou e de suas próprias lembranças, que as angústias de sua irmã remetiam às angústias que eram também suas e de tantas outras jovens transitando entre o ser menina e o ser mulher, fez o propósito de transformar isso em filme, privilegiando a todos que estiverem dispostos a ver, pensar, degustar sua obra e ir além.
Decididamente, é o convite ao daqui para frente. Tanto é que o filme não culmina na perda. Ao contrário, está aí para provar que a criação possibilita a continuidade da vida ainda que seja difícil. Aliás, alguém disse que viver seria fácil?
Como pode ser visto no filme, quando Petra era criança e a amiguinha perguntou o que acontecia com sua irmã ela pode responder apenas: “Ela é assim, ela é assim…” Anos depois, com a produção do filme, volta à sua definição infantil que parece nunca ter sido resposta suficiente. Afinal, o que define mata o sujeito. “Ela é assim…” Assim como? Será que alguém É ASSIM ou ESTÁ assim, diferentemente assim, nos mais diversos momentos da vida?
É a partir disso que podemos fazer a diferença no mundo pela via da palavra.  A história pregressa é sim imutável, mas o que está por vir consiste nas peças embaralhadas do mais instigante quebra cabeças: a vida. E o que será feito com elas pertence indiscutivelmente à escolha de cada um. Ou alguém ainda está colocando nas mãos do destino a escritura da própria existência?
À medida que tudo aquilo que parece não ter nome passa a ser nomeado, a possibilidade de suportar o tempo, as dores, as perdas, enfim, o real duro de roer, está aberta. Focando no daí para a frente o que vem é invenção.
Não se trata de tamponar a falta pela via da arte ou da palavra, mas encontrar o que fazer com esse vazio e seguir abrindo caminhos apesar da falta que não cessa de existir para o ser falante.

*CRP 18/00078
Delegação Geral – MS/MT – Escola Brasileira de Psicanálise
Consultório: 66 3421 5684

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