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Sueli ignoti - 29-11-11

Percebendo o movimento das pessoas em função da proximidade do Dia de Finados e vem à tona a morte como tema.  Interessante observar essa mobilização.  Providências são tomadas, viagens agendadas, encontros marcados, visitas feitas tanto a familiares distantes quanto aos cemitérios onde foram sepultados os entes queridos. Sem dúvida uma forma de mantê-los vivos na lembrança.  Cada um a seu jeito pode refletir sobre a morte a partir do real da perda.

Mas, cabe aqui uma reflexão de outra ordem: e a morte fazendo parte do cotidiano?  Não falo da morte daqueles que se vão a cada dia, mas da minha, da sua… Nós que continuamos vivos, o que podemos fazer para por a morte nas contas e a partir disso operar a diferença aqui e agora?   Não podemos dizer que seja essa uma tarefa fácil, mas sabemos também que fugir do difícil em nada ajuda.

Temos abundantes referências nas artes de todos os tempos. Ficamos aqui com Ingmar Bergman e dois grandes filmes sob sua direção. Em “O sétimo selo” (1957) o cavaleiro medieval (Max Von Sydow) se depara com novas questões sobre a vida ao retornar das Cruzadas e encontrar seu país – Suécia – devastado pela peste negra. É surpreendido pela Morte (Bengt Ekerot) que garante ter chegado sua hora. Na tentativa de ganhar tempo convida-a para uma partida de xadrez. Desafio aceito. Por que a Morte não o aceitaria sendo ela a única com a qual todos podem contar, sem margem de erro? No entanto, o jogo serve também ao homem. Jogar possibilita vencer o medo que paralisaria. Cada jogada uma tentativa de ser melhor que o adversário, aprimorando a técnica. O jogo o mantém vivo e encarar essa adversária imbatível passa a fazer parte do possível mesmo sabendo que ser vencido é só uma questão de tempo.

Ainda em 1957 com “Morangos Silvestres” Bergman propõe o enfrentamento da morte, mas dessa vez antes de sua chegada, simplesmente por prever sua proximidade.   Cabe ao professor Isak Borg (Victos Sjöström), médico veterano que viaja em companhia de pessoas jovens, para receber uma homenagem por anos de dedicação e destaque em seu trabalho, pensar a morte a partir da retrospectiva de vida. Saindo da estrada principal o professor vai pelo atalho que o leva à casa antiga onde passava férias. Reencontrar o canteiro dos morangos silvestres funciona como senha para as lembranças que fazem aflorar toda sua história num dia. Velhas questões, quem sabe ignoradas por toda a existência, emergem. Suas reflexões e preocupações com a finitude, permeadas pela companhia dos mais jovens, podem alavancar o novo no tempo que lhe resta.  Até que chegue a Grande Dama, há tempo para nortear a vida por caminhos até então inexplorados.

Embora seja a vida um jogo com a morte, sabendo ser ela a vencedora num final cuja data não está prevista, cabe ao homem escolher como fazer cada jogada que pode ser a última. Quando a morte é colocada nas contas podemos pensar na “partida” como o sistema que permite fazer funcionar o motor de um automóvel, remetendo a princípio; como uma competição esportiva acontecendo com cada participante empenhado em dar o melhor de si e ainda como o ato de partir, ir embora. Pensando a morte assim fazendo parte da vida no início, meio e final, o que poderíamos ganhar para a existência? Alguém que sabe, por exemplo, que uma viagem pode ser a última desiste de fazê-la ou aproveita-a ao máximo?

Com tantos avanços na área da saúde a longevidade tem sido uma das grandes conquistas. A expectativa de vida tem aumentado com cuidados preventivos e cura de doenças outrora mortais. Evidentemente, isso traz satisfação à raça humana. No entanto, vale lembrar a consideração de Alexis Carrel (1873-1944) – fisiologista, cirurgião, biólogo e sociólogo francês: “Não se trata de acrescentar anos à vida, mas vida aos anos.”
Que possamos fazer um bom jogo!

*CRP 18/00078
Delegação Geral – MS/MT – Escola Brasileira de Psicanálise
Consultório 66 3421 5684

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