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Goncalo Antunes - 29-12-14

Na sentença de Sartre, ’eu sou meu passado’, portanto, não o tenho, eu o sou, traz questionamentos acerca da forma como as coisas nos afetam. Como apreendo a realidade circundante e a representação que tenho de tudo o que acontece, do que existe, até do que não vejo, mas acredito. Se ficar magoado ou não, ou se sentir em estado de lisonja, ao deparar com a lembrança ou mesmo crítica de ato que pratiquei, há afetação do que sou e sou exatamente aquilo que a liberdade (tomemos por livre arbítrio) me proporcionou. Não há dissociação do próprio passado.
E como aceitar que num momento de fé, independente das obras (aqui como construção de um ser), possa o existir expiar seus pecados? Por existir, é soma, e não subtração, de tudo que é. E tudo que é não se apaga, ainda que haja arrependimento. Ao contrário, seria a hipótese de se aceitar a construção de uma casa pelo telhado, ou mesmo a morte pelo remoçar, o que seria demasiado contraditório, senão impossível. ‘A morte transforma a vida em destino’ (Malraux), e não há destino que transforme a morte em vida.
No momento da morte, existimos (somos), o que abala profundamente o crente, pois, se há julgamento, o é pelo conjunto e não pelo último suspiro, pela aceitação última, ainda que honesta. ’Porque, assim como o corpo sem espírito é morto, assim também a fé sem obras é morta’ (Tg 2.26). Sartre era ateu; imagina o que produziria se não o fosse, ou talvez não o fosse e não sabia. Quem sabe uma maior inspiração em Agostinho, Tomas de Aquino, ou mesmo Descartes, não o ajudasse? Mas se é, existe como construção, e não caberia bem à glória, o renegar-se.
Voltemos. No instante da morte, o que sou? O que me define? O passado. É aterrorizante, mas é o que há. E não há misericórdia possível na justiça do que se define como infinito, puro, imortal, onisciente e justo. Acreditar no contrário é muleta, bálsamo para as dores de consciência. Aqui está o sucesso das religiões. Não se pode prometer indulgência em nome daquilo que não se define, que é tudo e tudo o é. Seria como tentar misturar água e óleo, mente e corpo, consciência e ilusão.
Olhe para você e, de forma absolutamente induvidosa, entenda que isso que vê é seu fundamento. Mas se queres entrar em estado de felicidade, ainda que de forma digital e não analógica (risos), terás que se contentar com a ingenuidade dos que afirmam a fé acima das obras. Mas ainda assim, aquele que a tudo vê, por existir sem que o possamos, não se tem por pluralidade, e da sua singularidade, por perfeição de que se reveste, o erro no julgar é ilusão à disposição da covardia, ou também da teimosia, de quem quer malograr a verdade.
É por aí…

(*) GONÇALO ANTUNES DE BARROS NETO é juiz de Direito em Cuiabá – [email protected]

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