Na quarta-feira das cinzas (22 de fevereiro) a Igreja entrou no tempo da quaresma, quarenta dias que lembram a dura caminhada dos Israelitas no deserto: “Por quarenta anos aquela geração me desgostou, então eu disse: é um povo de coração transviado, que não reconhece meus caminhos (S 95).
Israel no deserto:
A mão sacerdotal deu a esta caminhada o sentido seguinte: “Eu vos farei sair das corvéias do Egito. Tomar-vos-ei como meu povo, e para vós eu serei Deus. Eu vos farei entrar na terra que dei a Abraão, a Isaac e a Jacó” (Ex 6,6-8). O primeiro passo é a libertação dos Israelitas da escravidão do Egito, o segundo passo é a longa caminhada no deserto, quando Deus toma Israel como seu povo e o povo reconhece Javé como seu Deus, o terceiro passo será o dom da terra prometida.
O deserto é o lugar onde se aprova a aliança. A primeira prova será a passagem do mar. O povo tem medo e quer voltar para a escravidão. Mas depois da passagem o povo acreditou em Javé e em Moisés, seu servo (Ex 14,31). Agora o povo murmurou por falta de água, depois murmurou por falta de comida, no Egito estavam sentados junto à panela de carne. Na água de Massá e Meribá de novo este povo murmurou perguntando: “Javé está ou não no meio de nós?” (Ex 17,7). Enquanto o povo duvida, se Javé está presente, não é “seu povo”, enquanto confia em Javé, é “seu povo”.
Jesus no deserto:
Os Evangelhos contam como o Espírito impeliu Jesus para o deserto durante quarenta dias, tentado por Satanás. Repete-se a situação do povo de Israel, mas devemos lembrar, que Jesus se retirou várias vezes no deserto para rezar e que as tentações se repetem na confrontação com os ouvintes. Mateus e Lucas esquematizam as tentações (Mt 4,1-11 e Lc 4,1-13).
A tentação do povo no deserto:
Naquele tempo o povo quis voltar para o Egito, tinha nojo deste maná, preferiu a escravidão à luta pela liberdade. Jesus vai enfrentar a mesma tentação: o povo sempre quer um Messias milagroso que sacia a curiosidade dele e não quer se orientar na palavra de Deus. A tentação, vinda do sacerdócio, na cidade Santa: lá o Templo é o lugar dos sacerdotes e dos escribas com a Bíblia na mão, que produzem palavras piedosas, que falam, mas não fazem. A tentação mais perigosa é o Satanás no Santuário para por à prova Deus. A tentação dos políticos numa montanha muito alta, onde se imaginam os reinos do mundo e suas riquezas. Aqui o confronto com o poder político, finalmente representado por Pilatos. Não pode servir a Deus e ao Mamom.
A Igreja no deserto:
Na Quaresma, a igreja também prepara para o batismo. Não se fala mais da saída do Egito, nem da entrada na terra prometida. Paulo escreveu aos Romanos (Rm 6,4-8): “Pelo batismo o nosso homem velho foi crucificado com ele… não sejamos mais escravos do pecado, cremos que também viveremos com ele.” O homem velho nos lembra da escravidão do Egito, quando Israel estava sempre tentado de voltar para a escravidão. Paulo generaliza e fala: não sejamos mais escravos do pecado. Isto é um apelo e não um fato, um sacramento não é magia, mas um desafio. O homem novo é o Ressuscitado e seu reino, não mais a terra prometida. Cremos ou confiamos que viveremos com ele no futuro, é o alvo do batismo que se deve alcançar. O justo vive por sua esperança. Nós vivemos entre o passado, o homem velho crucificado, e o futuro, a nova vida. Vivemos no presente, no deserto com as suas tentações. O objetivo da Quaresma e da nossa vida será tornar-nos seu povo, sua comunidade, e ele será nosso Deus.
(*) Pe. Martin Huthmann é vigário da Paróquia São Francisco de Assis – Jaciara
