Nesses últimos anos como professor e eterno aluno, experimento a sensação de que a escola, diferente de outras instituições modernas, é um espaço pedagógico comunitário, em que múltiplas culturas, crenças e valores se encontram diariamente. Isso dá aos sujeitos que ali estão a possibilidade concreta de entender o mundo sob perspectivas distintas, o que de certo modo enriquece a formação estudantil.
Esse exercício de análise quanto à natureza dos encontros que são efetivados na instituição escolar é um convite a valorização do currículo oculto que cada ser humano possui como resultado de sua constituição histórica, isto é, de suas vivências e experiências ao longo da vida. Entretanto, nem sempre fomos educados pela família e ensinados pela escola a conviver com outro, considerando, nesse sentido, paradigmas, opiniões e interpretações que diferem dos nossos modelos morais e até mesmo éticos. Aliás, há inúmeros discursos sobre a importância do sentimento democrático, todavia, na prática só ouvimos as nossas vozes, a lógica do nosso grupo.
Infelizmente, não permitimos que o outro fale, ou quando há o exercício dessa fala o ignoramos, visto que seus lugares de fala não são os nossos, logo, não quero ouvi-los não por conta da plausibilidade do conteúdo, simplesmente, porque só enxergamos o mundo a partir do nosso modelo hermenêutico, ou seja, da nossa visão de mundo.
Isso parece ser um tanto quanto estranho, ou no mínimo patológico, posto que, para alguns o espaço democrático e a liberdade de expressão só podem ter um caráter verdadeiro quando são protagonizados por eles mesmos, não permitindo, a prática real do contraditório, da antítese, e acima de tudo, do diálogo sensível, fraterno e honrável.
Portanto, nessa configuração problemática da nossa passionalidade, o filósofo e sociólogo Habermas, da Escola de Frankfurt, nos apresenta um caminho de como podemos mediar o encontro entre cosmovisões diferentes. Para ele, a razão comunicativa ou ação discursiva revela um tipo de racionalidade que conduz a sociedade ao universo da ágora, a praça pública, o ambiente onde todos podem falar, ouvir e perceber os limites de sua percepção de mundo, atravessando e sendo atravessados mutuamente na relação comunitária do conhecimento.
A educação para o século XXI, tanto aquela que é produzida em casa quanto a das instituições de ensino precisa considerar que a verdade não é um produto dialético industrializado, ou está reclusa a um determinado campo racional de rigor científico, se revela nos exercícios lógicos da reflexão e da inter-relação comunitária. De tal maneira, que a aprendizagem se transforma num caminho de análise crítica dos fenômenos e a escola um espaço de conhecimento científico, cultural e humanitário, onde todos possuem o direito e o dever de comunicar o seu pensamento.
O desafio de professores, pais e de cidadãos conscientes envolve um tipo de maturidade existencial que tenha o compromisso e o prazer de desvendar o mundo em busca do princípio da verdade, e essa investigação deve considerar realmente o espírito democrático, porque, muito mais do que ter uma cultura filosófica, somos convidados a um exercício filosófico permanente, e isto, pode ser feito por qualquer pessoa, assim, seremos convencidos, pelo verdadeiro, e não pela manipulação da verdade. É tempo de resgatar o sentido crítico de que a escola é um espaço de aprendizagem tanto científico-escolar quanto relacional.
(*) Emerson Arruda é teólogo, historiador, filósofo e pedagogo, licenciando em Sociologia, mestre em Educação, doutor em História pela UFMT, doutorando e pós-doutorando em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Mackenzie e professor do CIE – Centro Integrado de Ensino, da Faculdade FASIPE e da UNIPLAN em Rondonópolis, Mato Grosso.