Organismos internacionais, candidatos de oposição e protestos realizados na Venezuela aumentam a pressão sobre o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) do país para que publique as atas eleitorais que mostram os resultados por mesa de votação.
Questionado pela Agência Brasil sobre quando e como os dados seriam disponibilizados, a assessoria de imprensa do CNE informou que “o Poder Eleitoral está atuando”.
Os candidatos opositores que disputaram a presidência da Venezuela Enrique Márquez, Javier Bertucci e Antonio Ecarri se juntaram a Edmundo González para pedir que se publique os documentos. Enrique já denunciou supostas irregularidades no processo eleitoral.
O Centro Carter, observador internacional que avalia a eleição venezuelana, divulgou nota pedindo a publicação das atas.
“A informação das atas transmitidas ao CNE é indispensável para nossa avaliação e fundamental para o povo venezuelano”, disse.
A Organização dos Estados Americanos (OEA), por sua vez, divulgou um informe nesta terça-feira (30) afirmando não ser possível reconhecer o resultado emitido pelo CNE.
“Não se explica por que o CNE demora em subir as atas ou, de alguma outra forma, colocá-las à disposição das forças políticas e dos meios de comunicação”, cobra, acrescentando que “a opacidade e o silêncio da autoridade eleitoral geram dúvidas legítimas sobre os resultados”.
O secretário-geral das Nações Unidas (ONU), António Guterres, também pediu “total transparência e incentiva a publicação em tempo útil dos resultados e da lista dos locais de voto”, segundo informou a porta-voz da ONU.
Nesta segunda-feira (29), o chefe do Ministério Público da Venezuela, Tarek William Saab, informou que o CNE divulgaria as atas “nas próximas horas”, porém os dados ainda não foram publicados e a página da instituição eleitoral na internet segue fora do sistema.
Saab e o CNE justificam que um suposto ataque hacker contra o sistema foi o responsável por atrasar os trabalhos do órgão eleitoral.
O governo brasileiro, que saudou a eleição venezuelana por ter sido pacífica, aguarda a publicação das atas eleitorais, que considera “passo indispensável para a transparência, credibilidade e legitimidade do resultado do pleito”.
Vários protestos violentos contra o resultado da eleição foram registrados no país.
Pelo menos sete pessoas morreram durante os protestos iniciados nesta segunda-feira (29) na Venezuela contra a reeleição do presidente Nicolás Maduro.
Segundo o grupo de ativistas pelos Direitos Humanos Foro Penal, especializado em prisioneiros políticos, pelo menos 46 pessoas foram detidas em manifestações por toda o país.
As sete mortes foram confirmadas por fontes independentes, segundo o jornal espanhol El Mundo, nesta terça-feira (30).
O presidente reeleito Nicolás Maduro, em pronunciamento em canal estatal, criticou os atos, e disse que se trata de outra tentativa de golpe de Estado.
Ainda segundo Maduro, parte dos responsáveis pelos atos foram presos.
“Por debaixo desse plano estão os gringos. Sempre estão”, afirmou o mandatário.
Acrescentou ainda que convocará o Conselho de Estado e o Conselho de Defesa da Nação e denuncia que “a ultradireita mundial montou um golpe de Estado contra a Venezuela”.
Denúncias
O candidato oposicionista Enrique Márquez disse que parte das testemunhas do seu partido não puderam entrar nas mesas de votação e que algumas atas eleitorais não foram entregues às testemunhas.
Além disso, disse que a testemunha ligada a ele, que estava na sala de totalização do CNE, não presenciou a emissão do boletim que declarou Maduro reeleito.
“A informação que nos dá é que na sala de totalização não se imprimiu o boletim número 1”, disse, argumentando que o documento deve ser emitido na frente das testemunhas da oposição.
“Não sei de onde sacou o senhor Amoroso esse papel”, disse. Elvis Amoroso é o presidente do CNE.
Márquez informou ainda que a auditoria sobre o sistema de telecomunicações do CNE, prevista para esta segunda-feira, foi suspensa sem explicações.
A opositora Maria Corina Machado, que indicou o candidato Edmundo González para concorrer em seu lugar, disse que eles tiveram acesso a 73% das atas emitidas pelas mesas de votação e que elas indicam a vitória do opositor.
A oposição ainda lançou um site para publicar as supostas atas que adquiriram nas mesas de votação.
Segurança das urnas
Os votos computados nas urnas eletrônicas da Venezuela devem ser enviados por sistema próprio – sem conexão com a internet – para uma central que totaliza todos os votos.
Ao mesmo tempo, deve ser impressa uma ata no local da votação e distribuída cópias para todos os fiscais.
Posteriormente, é feita uma verificação, por amostragem, para saber se os votos enviados pela urna eletrônica são os mesmos entregues aos fiscais.
Há ainda a possibilidade de auditar as urnas com os votos impressos. Isso porque na Venezuela, além do voto eletrônico, há o voto em papel.
Porém, o CNE ainda não divulgou as atas que justificaram o resultado anunciado, que deu vitória a Maduro com 51,21% dos votos, contra 44% para Edmundo González e 4,6% para os outros oito candidatos.
O diretor do Votoscopio, Eugenio Martínez, que lidera organização especializada em monitoramento de eleições na Venezuela, explicou que como não foi publicado o resultado discriminado por mesa de votação, não é possível auditar o resultado.
“A audibilidade do sistema deveria garantir que você possa entrar, neste momento, na página web do CNE, buscar o centro de votação e a mesa eleitoral e ver qual foi o resultado que o CNE publicou”, explicou.
A situação atual diverge de eleições anteriores. O Centro Carter, que monitora eleições da Venezuela desde 1998, chegou a afirmar, em 2012, que o sistema era “o melhor do mundo” por permitir 16 auditorias.
Nas eleições municipais e estaduais de 2021, apesar das críticas a um “padrão de repressão política”, de “direitos severamente restringidos à participação política” e ao cerceamento à “liberdade de expressão”, o instituto não questionou a segurança do voto em si.
“O sistema eleitoral da Venezuela é totalmente automatizado e o CNE [Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela] audita todas as fases do processo”, garantiu o comunicado do Centro Carter, em 2021, acrescentando que “uma série de auditorias foram realizadas durante e após o processo eleitoral, na presença de especialistas, representantes de partidos e observadores. Todos os auditores concordaram que o sistema de votação eletrônica é seguro”.
Alerta de segurança para brasileiros
O Ministério das Relações Exteriores (MRE) (foto) emitiu um alerta consular para brasileiros que estão na Venezuela.
Após a proclamação de Nicolás Maduro como presidente reeleito, manifestantes tomaram as ruas da capital Caracas, em meio a apelos da oposição e da comunidade internacional para que as contagens completas dos votos sejam divulgadas.
No comunicado, o Itamaraty pede que brasileiros residentes, em trânsito ou com viagem marcada para a Venezuela mantenham-se informados sobre a situação de segurança nas áreas onde se encontram e que evitem aglomerações.
“A Embaixada do Brasil, em Caracas, permanece atenta à situação das cidadãs e dos cidadãos brasileiros no país e disponibiliza, em caso de emergência envolvendo seus nacionais, o seu plantão consular, +58 414-3723337 (com WhatsApp)”, informou o Itamaraty.
Ainda de acordo com o alerta, o plantão consular geral do Ministério das Relações Exteriores pode ser contatado pelo telefone +55 (61) 98260-0610.